sábado, 6 de janeiro de 2018

Reflexões sobre Psicologia e Psicopatologia

Para que o diagnóstico não seja uma etiqueta ou um simples procedimento classificatório digno de um “jardim das espécies” apropriado para a botânica ou para o zoológico é necessário que ele cumpra a função de remeter à estrutura que o condiciona. Como não temos na psiquiatria a autópsia
que venha confirmar a doença da qual o sintoma seria o sinal, é na construção do caso clínico – a partir de um saber sobre a subjetividade particular de cada paciente que a psicanálise permite elaborar – que um diagnóstico aparecerá como conclusão do processo de investigação.

Freud construiu as entidades clínicas da psicanálise com base na nosografia da psiquiatria clássica, o que foi continuado pelas diversas correntes da psicanálise, inclusive por aquela em que nosso projeto se inscreve que é a de Jacques Lacan.“As categorias que utilizamos hoje provêm da psiquiatria clássica: neurose, perversão e psicose, esta última repartida em dois grandes tipos, esquizofrenia e paranóia. A cada uma dessas categorias podemos fazer corresponder um nome na história pré-psicanalítica. Para a paranóia, Kraepelin, para a esquizofrenia, Bleuler, para a perversão, Krafft-Ebing e para a neurose, Charcot.” Podemos acrescentar à nosografia analítica também os dois grandes
tipos clínicos da neurose – histeria e neurose obsessiva – e à psicose um terceiro tipo clínico que é a melancolia, base da psicose maníaco-depressiva, que Freud adota principalmente a partir de Emil Kraepelin.

Temos que recordar que o DSM e o CID são manuais de diagnóstico e não de psiquiatria. Como dizia René Olivier-Martin, referindo-se ao DSM-III, “observemos que ele de modo algum é um manual de psiquiatria, que só pretende ser manual de auxílio para diagnóstico, útil ao prático em suas orientações terapêuticas, para avaliar comparativamente a eficácia das terapêuticas e fazer uma coletânea estatística”.

Fundar uma prática de diagnóstico baseada no consenso estatístico de termos
relativos a transtornos, que, por conseguinte, devem ser eliminados com
medicamentos, é abandonar a clínica feita propriamente de sinais e sintomas
que remetem a uma estrutura clínica, que é a estrutura do próprio sujeito.

Prevenido pela psicanálise,o clínico da psiquiatria, não importa sua qualificação, terá outra atitude
diante do sintoma apresentado pelo paciente, evitando assim o furor sanandi de exigir a qualquer custo a suspensão do sintoma. Pois lá onde há sintoma, está o sujeito. Não atacar o sintoma, mas abordá-lo como uma manifestação subjetiva, significa acolhê-lo para que possa ser desdobrado, fazendo aí emergir um sujeito – seja no ataque histérico, na depressão melancólica, no delírio
paranóico ou no despedaçamento do esquizofrênico. Tratar do sintoma não significa necessariamente barrar ao sujeito “o acesso ao real que o sintoma denota e dissimula”.

“Os diagnósticos clínicos são importantes, pois proporcionam uma orientação, mas o ponto decisivo é a questão da história do doente, pois revela o fundo humano, o sofrimento e somente aí a terapia pode intervir”.
Na análise o médico deve aprender a conhecer sua alma e a tomá-la a sério para que o paciente possa fazer o mesmo. A alma é muito complexa... não é só um problema pessoal mas um problema do mundo inteiro e é a esse mundo inteiro que o psiquiatra deve se referir.”  
(Carl Gustav Jung)
“Existe um arquétipo médico-paciente que é ativado todas as vezes que uma pessoa fica doente. As feridas e doenças só serão curadas se entrar em cena o médico interior. Ele é ativado através da assimilação dos símbolos no campo transferencial”.
(G. Craíg)